sábado, 27 de outubro de 2012
Deus tem saudade
Vejo o quanto estamos longe de ser uma igreja de verdade.
Ser igreja é compartilhar, é fazer algo pelo outro quando este passa necessidade, é priorizar a comunhão, o ensino, o partir do pão e as orações, como faziam os primeiros cristãos.
Acredito que Deus tem saudade.
Deus tem saudade de uma igreja que não se fecha em seus grupinhos de afinidade, mas procuram ter comunhão com todos, para que todos possam viver bem. Uma igreja que conquista a simpatia do povo não por ter um pastor “famoso”, nem por ter pessoas ricas que possuem o carro do ano, tampouco por fazer milagres na televisão, mas Deus tem saudade de uma igreja humana. Humana porque Jesus se fez humano, e, mesmo sendo Deus, se igualou a nós. Se queremos ser iguais a Jesus, se dizemos que temos Jesus como exemplo, devemos fazer o que ele fez: nos tornarmos humanos, nos tornarmos iguais.
Jesus ressuscitou, vencendo a morte e a injustiça. Por que tanta gente morre todos os dias, e por que existe tanta injustiça? Muitas vezes elas morrem porque as deixamos morrer. Há pessoas caminhando para a morte todos os dias, seja nas drogas, na bebida, na prostituição, ou até mesmo passando fome, e somos indiferentes a essa dor. Há pessoas que perderam suas casas, sendo despejadas, vítimas de golpes, em enchentes ou por que não tiveram condições de pagar um aluguel absurdamente caro. Também existem pessoas com duas ou três casas, vazias. Onde está o compartilhar, onde está a justiça?
Se há injustiça é porque não lutamos pra que haja justiça. A culpa é nossa, na maioria das vezes. As pessoas que estão na cracolândia e na prostituição não são tão diferentes da gente assim, como muitas vezes nós pensamos. A diferença é a falta de oportunidade, de uma segunda chance. E o amor de Deus é visto assim, numa conversa, num abraço, numa nova chance.
Fico pensando onde foi que nos perdemos. Não que a igreja primitiva fosse perfeita, temos Ananias e Safira como exemplo de problemas que existem na igreja até hoje. Mas ao que me parece, nosso amor se esfriou, e nos acostumamos. Passamos por um morador de rua e viramos o rosto para o outro lado. Vemos pessoas passando necessidade todos os dias, e não temos coragem de dividir nosso pão. Se alguém comete pecado, somos os primeiros a acusar. Nos acostumamos a excluir pessoas apenas por serem diferentes de nós. Com essa atitude, nos afastamos cada vez mais do amor de Deus e nos tornamos mais diferente dEle.
Nos queixamos para Deus, dizendo: “Deus se esqueceu de mim”, mas na verdade nós nos esquecemos de ser como Ele.
Deus tem saudade e quer que voltemos ao primeiro amor. Um amor não só de palavras, mas de atitude, capaz de lutar contra o sistema e a favor da vida do próximo.
Acredito que Deus tem saudade, e se você também tem saudade de Deus, não se acomode com o que incomoda. Olhe para Ele, porque o amor dEle vai te fazer olhar para o outro.
terça-feira, 23 de outubro de 2012
A luta continua
Algumas coisas geram em mim uma revolta sem tamanho.
Semana passada aconteceu algo que me deixou muito triste. Uma menina de 9 anos que participava do trabalho com a gente ás vezes (ás vezes pq a mãe raramente deixava, pois obrigava a menina a cuidar da irmãzinha mais nova, um bebê de 6 meses. A mãe só ficava sentada, fumando, enquanto a menina, olhando todas as crianças pulando corda sacudia a criança no colo para o bebê parar de chorar. Sempre que eu podia, pegava o bebê e fazia o dormir, mas não achava certo a mãe ficar lá sentada sem fazer nada, sem dar importância para nenhuma das duas filhas.)
Bom, esse foi só um parêntese e a minha revolta já começa por aí. Mas, semana passada, essa menina foi estuprada pelo pai. E não foi a primeira vez que ela sofreu esse abuso. A diferença é que dessa vez todo mundo ficou sabendo, pois um vizinho ouviu os gritos da menina, e, por um buraco na parede, viu o que estava acontecendo. E o pior é que a mãe sabia de tudo. O homem fugiu quando chamaram a polícia.
Quando fiquei sabendo disso, pensei em fazer algo por ela, cuidar mais da menina, trazer mais pra perto. Mas, quando cheguei na favela, ela também tinha ido embora.
Fico imaginando o futuro dela, sabendo que passou por algo tão traumático. Conheço pessoas de 20, 30 anos que sofreram abuso dos próprios pais ou padrasto, ou até mesmo de homens da igreja quando crianças, e hoje tem problemas de se relacionar, ou viraram travestis e se entregaram as drogas e ao crime.
Uma criança de 3 anos me contou que quando vê o pai bater na mãe, ele tem vontade de bater no pai pra defender a mãe. Fico pensando até quando ele vai defender a mãe, e me preocupa o fato de que ele um dia possa se tornar igual ao pai, de tanto ver essa cena como exemplo.
E assim a violência continua gerando mais violência. Até quando vamos deixar isso acontecer? O que podemos fazer para impedir que tais coisas aconteçam? Esses casos que mencionei, são apenas alguns casos. Quantas crianças nesse exato momento não estão sofrendo abuso?
Está na hora de cuidarmos uns dos outros e de nós mesmos também.
Quem tem o direito de levantar a mão para uma mulher? De passar a mão em uma criança?
Temos que lutar, denunciar, gritar. Orientar os filhos e vigiar.
A luta continua.
quarta-feira, 17 de outubro de 2012
As escolhas que a gente faz.
Tudo parecia tranquilo. Ele tava há anos na casa, e eu confiava muito nele! Era ele quem tocava violão quando eu não estava muito a fim de tocar, ele brincava com as crianças, que amavam estar com ele, dirigia a kombi de vez em quando, estava reformando a nossa casa na favela, e era ele quem ia andando comigo quando eu tinha medo de andar sozinha de noite.
Teve um dia, durante o trabalho no centro de sp, que uma criança tava chorando muito. Ela começou a se abrir comigo e com o Ricardo, e disse que pai dela é viciado, e está preso. Também contou como foi abusada pelo tio quando era mais nova. Falou, chorando que queria que o pai e o tio mudassem de vida. E o Ricardo começou a falar da vida dele, como ele conseguiu se libertar das drogas e como tudo é diferente agora. Isso foi acalmando a menina, e ela falou: "Posso te pedir uma coisa? Não muda nunca! E parabéns por ter conseguido sair das drogas."
Fico me lembrando dessas coisas e de cada conversa que a gente já teve. De quando ele me falou que sempre que pensava em desistir, também pensava em mim e nas pessoas que estão dando a vida para que ele mude de vida, e isso dava forças pra ele não desistir mais.
Hoje tive que tocar violão sozinha!
Semana passada ele foi levar as crianças para a escola e não voltou mais. Além disso, foi embora e levou a kombi junto,. Quando soube disso fiquei muito triste! Não por ficar sem a kombi, apesar de ser algo muito importante para o nosso trabalho. Mas pela atitude de alguém que conquistou a confiança de todo mundo. mais ainda, pela vida que voltou a ser destruída pelas drogas. E logo vem a pergunta: "o que eu poderia ter feito? Onde foi que eu errei?". Imagino o sofrimento dos pais que perdem seus filhos para as drogas.
Ontem ele voltou, mas não disse nada. Foi embora de novo, não que ele não quisesse ficar na casa, mas teve que ir, porque talvez seja melhor não dar mais uma chance, a milésima chance, para a pessoa aprender a refletir e a valorizar as oportunidades.
Ou pode ser que isso não funcione... sei lá.
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